Quando eu era uma Desenvolvedora de Softwares,
eu preferia iniciar um software do zero a dar manutenção nos softwares existentes.
Claro que essa não era uma decisão que
cabia a mim, o que acontecia é que eu tinha motivações diferentes, quando era
um software novo ou uma manutenção.
Um software novo me abria possibilidades
de inovação, de tentar novas técnicas, todo o design e codificação com muito
mais liberdade, mesmo com uma lista de requisitos rigorosa, eu sentia independência.
Na manutenção eu devia dar continuidade
a uma ideia quadrada, concebida, muitas vezes, há mais de uma década. Ou seja,
mesmo que eu não concordasse com a estrutura criada, eu não podia mudá-la, devia
me adaptar a ela. Quando era inevitável atualizar a estrutura, era bem pior,
porque a manutenção, muitas vezes, desencadeava uma reação em cadeia e afetava
outros aplicativos (consumidores ou fornecedores de dados para aquele em
manutenção). Na grande maioria das vezes, o Analista não tinha pensado nisso,
as dores de cabeça eram inesgotáveis, e o prazo o mesmo, afinal ele tinha
estimado mal.
Quando me tornei uma Analista de Sistemas,
eu já tinha essa perspectiva em mente, então ao planejar uma manutenção, eu me
atinha a esses detalhes, e era comum um gerente vir criticar o meu prazo, ele não
estava acostumado com essa previsão por parte dos analistas. Nessas ocasiões, eu
tinha uma lista de aplicativos afetados, que eu já tinha mapeado. Só para não
perder a crítica, ele dizia que isso não estava no escopo. Aí, eu tinha que
usar de toda a minha diplomacia para lhe explicar, que caso ele tivesse dado
uma estimativa à minha revelia, devia renegociar, pois de nada serviria para o
cliente dar manutenção no software e ter transtornos em outros pontos.
Como vêem manutenção não é só a parte
de um trabalho, é um trabalho maior, e muitos clientes não percebem isso e tentam
argumentar que não estão construindo o software do zero, é “só uma manutenção!”
Por quê estou contando isso? Será que guardei
ressentimentos daquela época? Nenhum ressentimento. Só me ocorre que esse conceito,
de que a manutenção pode ser mais trabalhosa do que o novo, devia ser mais
explorado em tudo.
As grandes empresas do mercado se
assustam com a força das startups, depois tentam imitá-las, o que não dá muito
certo, ou dá um trabalho hercúleo. Isso porque as startups estão iniciando do
zero, estão pegando um caderno em branco e escrevendo sua história. Enquanto as
empresas remanescentes precisam inserir páginas no meio do caderno, arrancar outras
tantas, atualizar a grafia de algumas palavras ao longo do volume. Trata-se de
um caderno bem manuseado, qualquer forçadinha com a borracha, causa rasgos nas
páginas.
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Imagem criada a partir de: Pixabay |
É uma questão semelhante a da
Desenvolvedora de Softwares, que eu vivenciei, só que as empresas remanescentes
não podem optar por iniciar do zero. Elas têm uma carteira de clientes fiéis ou
dependentes do que já está estabelecido, a mudança não pode ser radical. Enquanto
as startups já nascem com um app pronto e 100% digital, as empresas remanescentes
tem um vasto universo analógico. Algumas precisam digitalizar seus arquivos em
papéis, mover os documentos físicos para depósitos preparados para guardar e
mantê-los adequadamente, pelo tempo que lhes for conveniente. O que representa
um alto custo por um certo tempo.
Trabalhando com Processos de Negócio,
ainda não tive a oportunidade de iniciar um processo do zero, mesmo que a
empresa não tenha a cultura de Gestão por Processos, e nem tenha a consciência
sobre seus processos, eles já existem e são executados de uma determinada
maneira, então qualquer coisa que se faça tem a intenção de melhorá-los, e,
portanto, trata-se de uma manutenção.
E manutenções precisam de atenção ao que
pode ser afetado por elas. Manutenções têm ramificações, no caso dos processos,
se a equipe for experiente, as ramificações serão encontradas com mais
facilidade. Mas, já vi profissional de processo dizer que vai tratar só da
parte visualizada pelo cliente, e que as ramificações podem gerar novos
contratos.
É o mesmo que instalar um aquário gigante
em um quarto superior da casa, saber que se o piso não tiver a sustentação adequada
para aguentar o peso dele, no futuro o cliente terá problemas, com o piso do
quarto desabando no andar inferior.
Na minha opinião, é melhor explicar ao
cliente que há essas questões a serem observadas, afinal eu sou uma
especialista, e devo dar todas as opções para ele decidir.
Assim como uma jornada de vida, traz
rugas, flacidez e doenças, também traz experiências e sabedoria. A história de
vida das empresas tem a mesma dinâmica, a empresa jovem e ágil de hoje, pode
ser a empresa velha e enrijecida de amanhã. As startups vão envelhecer, novas
startups com novo fulgor vão surgir, portanto qualquer que seja a empresa, ela deve
se preocupar com as manutenções, que nada mais são do que as atualizações.
Aquela remoçada básica, que os cosméticos, academias e cirurgiões prometem.
A melhoria dos processos, seja para alcançar
a transformação digital, ou para manter a empresa em ordem e atualizada, nada
mais é do que adicionar vigor a uma engrenagem corporativa, que deixou de se mover
com agilidade. «
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